Como lidar com as frustrações da criança?
- Carolina A. Barbosa
- 20 de out. de 2016
- 3 min de leitura

Bento, quatro anos de idade, havia ganhado no dia das crianças um brinquedo de super-herói. Para comemorar ainda mais a data, seus pais resolveram convidar alguns coleguinhas para passar o dia em sua casa. Enquanto ele estava se deliciando com sua mais nova aquisição, Caio, seu colega, se aproxima e tenta pegar o brinquedo de sua mão. Bento reage e tenta proteger seu presente, mas ele acaba se quebrando. Frustrado, começa chorar inconformado com a perda do brinquedo que há minutos o deixara tão feliz. A mãe corre para ver o que estava acontecendo, e depois de perceber o sofrimento do filho, o consola dizendo que em instantes iriam à loja para comprar outro brinquedo igual ao que havia ganhado.
Para iniciar esta discussão me parece oportuno começar com o fragmento deste caso fictício, pois, uma semana após o dia das crianças, muitos podem se identificar com a situação: uma criança frustrada e os pais desesperados, que tentam de todas as formas impedir que o filho sofra com a perda de um objeto utilizando os recursos de que dispõe. Afinal, quem nunca tentou poupar o filho dos sofrimentos gerados pela perda de um objeto?
Sentir-se frustrado não é exclusividade dos adultos. A decepção está presente na vida das crianças e tem papel importante no desenvolvimento delas. Embora nenhum pai queira vivenciar o sofrimento dos filhos, é preciso estar ciente de que a vida não é constituída apenas de momentos felizes. Sofrer faz parte da vida e parece que estamos esquecendo isso.
Atualmente a sociedade faz apologia à felicidade constante, especialmente pelos meios de comunicação/redes sociais. Este comportamento alimenta a ilusão de que a dor, a decepção e o sofrimento não fazem parte de nossa existência. Recusamos viver a tristeza e a falar sobre ela, afinal, só as coisas boas interessam. Estamos criando crianças com a ilusão de que passarão pela vida ilesas dos momentos ruins.
Todos nós passamos por situações desagradáveis em diversos momentos. Se não as tivermos vivenciado da melhor forma durante a infância, não saberemos lidar com as contingências posteriores da vida. Preparar as crianças para vida real favorece o amadurecimento delas e as tornam mais adaptadas a superarem futuras perdas.
Os pais, ao perceberem a frustração do filho, devem acolher esse sentimento, legitimando-o. É importante que os pais ajudem as crianças a nomear seus sentimentos, colocando-se disponíveis para ouvi-los sem tentar tamponar o vazio que uma perda ou impossibilidade os remete. Caso contrário, a criança desamparada descobre por si só os possíveis caminhos para lidar com os momentos tristes, sendo que estes podem levá-las a diferentes desfechos. No futuro, essas pessoas podem se servir da negação, de fugas, do comprar compulsivo e do uso de psicoativos legais e ilegais para lidar com aquilo que até hoje é inapreensível para elas. Desta forma, estarão mascarando os sentimentos e causando prejuízos para seu bem-estar físico e psicológico.
ENTÃO...
A vida real é cheia de prazeres, de alegrias e de conquistas, mas também de dores, frustrações e sofrimentos. De dias de céu azul e ensolarado e de frios e nebulosos.
As pessoas aprendem a lidar com os infortúnios da vida se, em momentos de frustração durante a infância, receberam dos pais, ou de quem assumiu essa função, uma significação sobre o que está se passando com elas. Diferente do que se apresenta no caso acima citado, em que os pais desesperados tentam reverter a situação apenas ofertando outro objeto para obturar a perda. Diante do choro gerado pela perda do brinquedo, a criança deveria ter sido acolhida pelos pais e vivenciado o momento com naturalidade. Afinal, perdas fazem parte da vida, e quando outros momentos desagradáveis vierem ao longo dos anos, um brinquedo pode não ser suficiente para aplacar seu mal-estar.
Certos caminhos podem ser tortuosos até que a pessoa se dê conta de que o sofrimento faz parte da vida e que por mais estranho que pareça, ele pode contribuir com seu amadurecimento. Propiciar espaço onde a criança possa se expressar pode aliviá-la da tensão e proporcionar saídas mais humanas. Os verdadeiros super-heróis são aqueles que aceitam os medos e as frustrações, fazendo deles apenas mais um momento normal.
OBS: O objetivo deste espaço é proporcionar aos leitores reflexões sobre as questões que permeiam o mundo infantil. Não irei ditar regras ou caminhos a serem seguidos. Fugirei de verdades absolutas e fórmulas milagrosas, pois cada caso apresenta uma singularidade e não é possível generalizar.
Este espaço não substitui o acompanhamento psicológico. Durante a psicoterapia, o terapeuta conhece a especificidade do caso e realiza um acompanhamento personalizado para cada um.
Leitores de Belo Horizonte-MG interessados em acompanhamento psicológico, favor entrar em contato via mensagem.
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